Tem B-Boy também nas propagandas!
Ele teve a infância no interior de São Paulo, na casa dos avós, mas foi na adolescência, em Minas Gerais, dentro de um Centro Olímpico, aos 13 anos, que se encantou pelo Breaking de vez e pelos movimentos Power Moves, que achava irados!
Estamos falando de Douglas Lima, também conhecido como B-Boy Pikira, que hoje é um dos principais B-Boys brasileiros que constantemente está presente em propagandas e comerciais publicitários. Confiram a entrevista:
BW: Queria que você nos contasse como foi sua infância. Em que local foi? Que lembranças você tem dessa época?
Pikira: Minha infância foi bem divertida (risos). Sempre fui um garoto bem alegre e brincalhão com todos, fui criado na casa dos meus avós no interior de São Paulo, junto de minha mãe, que foi minha mãe e meu pai ao mesmo tempo, venho de uma origem humilde, que nunca teve muita coisa, sabe? Mas, graças a Deus, nunca me faltou nada, principalmente educação e o carinho da minha família, que é o mais importante para mim, quando era criança eu gostava muito de jogar bola e andar de bicicleta na rua (risos). Que criança não gosta, né? (risos).

BW: Quando você teve o primeiro contato com a Cultura Hip-Hop?
Pikira: Olha, quando eu comecei a dançar eu tinha 13 anos de idade, eu só fazia por amor mesmo e por achar irado aprender os movimentos giratórios, que no Breaking se chama de “Power Moves”, que são os movimentos com impacto maior na dança, porque usa muito a força e agilidade do corpo, eu aprendi a dançar quando fui morar em Minas Gerais, onde eu frequentava um Centro Olímpico para jogar bola, foi ali que eu vi uns meninos fazendo Power Moves e dançando com um Boombox no chão, bem no cantinho da quadra de Futsal, foi naquele momento que me aproximei e perguntei pra eles se podia ficar olhando eles dançarem, aí eles me olharam meio marrentos e responderam que podia (risos), foi naquele momento que me encantei com a dança e decidi fazer aquilo… Mas, sem pensar em viver da dança, nem virar um artista, foi só por amor e admiração pelos passos e movimentos que eram irados pra mim, foi aí, então, que perguntei para um dos meninos que se chamava Marcos, que eu queria aprender a dançar e se ele poderia me ensinar alguns passos daquela dança, foi aí que ele me explicou que se chamava Breaking e que era um dos elementos da Cultura Hip-Hop, depois desse dia, ele me ensinou o básico, que foi o Top Rock, Drop, Footwork e o Freeze. Isso foi somente em um dia (risos). Ele me passou os passos e foi embora, aí eu fui para casa, coloquei uma música do Black Eyed Peas, que eu gostava muito e comecei a treinar os passos que ele me ensinou, treinei muito! Até ficar rápido e leve, aí fui novamente no Centro Esportivo, no dia seguinte, para mostrar pra eles o quanto eu aprendi treinando sozinho em casa, mas aí eles não foram no Centro Esportivo nesse dia (risos), eu fiquei triste, mas não desisti e fiquei lá até fechar, aí batendo 8h da noite chega o Marcos, o menino que me passou os fundamentos da dança no Centro Esportivo, aí falei pra ele que treinei e que queria mostrar pra ele o quanto aprendi, aí fomos para dentro da quadra e mostrei pra ele e ele ficou surpreso com a minha agilidade e rapidez de aprender tão rápido o básico, foi aí que ele falou para ir todos os dias no Centro Esportivo que ele iria me ensinar novos passos, fiquei muito feliz e fui novamente no dia seguinte, debaixo de chuva (risos), com minha mãe brigando comigo e perguntando o que eu iria fazer no Centro Esportivo, na chuva (risos)… Até então, ela não sabia que eu estava dançando, aí fui na chuva e o menino não foi (risos), fiquei triste demais nesse dia porque eu realmente estava ansioso para aprender mais passos e treiná-los para mostrar pra eles que eu seria bom naquilo, foi aí que continuei indo nos dias seguintes e eles não apareciam mais, aí um belo dia eu fui para jogar bola e já tinha desistido de ir até lá e não achar eles no Centro Esportivo dançando, aí fui jogar bola e encontrei não só com eles, mas com uns 15 caras reunidos treinando Breaking no mesmo lugar, foi aí eu falei “Uaaaal, que irado!” (risos), fui lá olhar de perto e o menino que me ensinou os fundamentos falou pra eu fazer na roda, ali, pra todos verem (risos), aí tomei coragem e fiz e ainda arrisquei uns movimentos que eu vi no jogo de Vídeo Game, que eu tinha comprado de B-Boy na época, aí os mais velhos deles, que foi o que ensinou eles a dançarem, me chamou para ir em outro lugar aonde eles treinavam fechado o grupo todo, fiquei muito feliz no dia (risos), confesso que nem dormi direito (risos). Aí, no dia seguinte, fui no treino que era numa antiga prefeitura, em uma sala fechada, foi aí que comecei a treinar de verdade e aprender novos passos e movimentos olhando eles fazerem, depois disso, eu treinei bastante e aprendi muita coisa em pouco tempo de prática e aí eles me chamaram para entrar na crew, desde então eu não parei mais.

BW: Quando de fato se dedicou ao Breaking? Você teve referências na dança? Pessoas que te influenciaram?
Pikira: Desde que comecei a dançar eu me dedicava muito ao Breaking, mesmo sem pensar em viver daquilo. Eu simplesmente só queria praticar e aprender novos movimentos todos os dias, mas o dia em que eu realmente parei e falei “é, eu realmente quero ser muito bom no Breaking e viver disso como profissão”, foi quando eu vi o UK B-Boy Championship 2008, em que o apresentador era o Crazy Legs, um dos pioneiros da dança, nesse DVD, que eu tenho até hoje, eu vi os B-Boys recebendo premiação em dinheiro e ganhando vídeo games de premiação para o 1° lugar, aí eu achei irado! Foi aí que me dediquei mais e mais. Referência para mim na dança foram meus amigos mesmo, que dançavam muito na época e faziam movimentos que até hoje vi poucos B-Boys fazerem com tanta leveza e facilidade que nem eles.
BW: Como sua família viu sua ligação com a dança? Você teve apoio deles?
Pikira: No começo minha mãe tinha medo (risos) ela chegou a ir em vários treinos escondido de mim para ver se eu não estava usando drogas (risos). Ela achava que Hip-Hop era coisa de drogado, mas com o tempo ela foi conhecendo os meninos e foi ficando tranquila e percebendo que não era isso que ela pensava, mas ela não gostava mesmo assim (risos), mas não brigava comigo também.
BW: Aprender o Breaking foi algo fácil ou houve movimentos que foram mais difíceis?
Pikira: Eu aprendi tudo muito rápido e sempre tive facilidade em executar os movimentos.

BW: Quando você começou a competir? Em que ano? Que eventos te marcaram mais e porquê?
Pikira: Meu primeiro campeonato foi em 2010, na minha cidade, em Minas Gerais, com minha crew, chegamos na final do campeonato (risos), fiquei muito feliz! O evento que mais me marcou foi o Chelles Battle Pro, em Goiânia, em 2013, aonde eu conheci o campeão mundial da Red Bull BC One que é B-Boy Lilou, da França, esse evento me marcou muito! Porque foi o primeiro campeonato de crew que valia vaga para fora do país e que ali estava de jurado o B-Boy Lilou e o primeiro Red Bull BC One Cypher que participei, em BH, na capital de Minas Gerais, foi lá aonde eu vi pela primeira vez os B-Boys que eram muito famosos, que era o B-Boy Pelezinho, B-Boy Aranha da Tsunami All Stars, que eram e são referência para muita gente até hoje, então, foi lá que eu me destaquei e cheguei na semifinal da Cypher da Red Bull e fiz amizade com o B-Boy Aranha, que hoje é meu grande amigo e que treina comigo diariamente.
BW: De onde surgiu o apelido Pikira? Tem algum significado?
Pikira: Meu apelido surgiu quando eu era criança, eu sempre gostei de liderar a molecada em tudo que fazíamos na infância e o apelido vem de um nome indígena que se chama Piquerobi, que é um Cacique líder de uma tribo indígena que se chama Inhanpuaçu, foi aí que tiram o nome de Pikira, que na época de criança erravam o nome e falavam Pikira (risos), aí ficou o apelido.
BW: Além da dança, você também foca muito seu trabalho na publicidade e na propaganda, correto? Fale sobre a importância do dançarino também trabalhar esse lado…
Pikira: Sim, além de dançarino de Breaking eu sou modelo e ator também, então, sobre importância eu acho isso muito de pessoa pra pessoa, sabe? Eu, particularmente, acho importante um B-Boy trabalhar com comerciais e publicidade de marcas, porque isso traz uma visibilidade muito boa para o dançarino que quer viver da dança, através disso ele pode arrumar patrocínios, ele vai ter contato com marcas grandes que podem querer organizar um evento de Breaking ou apoiar ele em alguma viagem para algum campeonato fora do Brasil, mas como eu falei antes, isso depende do objetivo de cada dançarino.

BW: Nos conte as principais propagandas que já participou?
Pikira: O primeiro comercial que eu quero falar é o da Casas Bahia, que eu fui o primeiro e único B-Boy a fazer a propaganda até hoje, no comercial eu fui o principal, fui chamado para dançar com os eletrodomésticos e no comercial eu faço um mortal para trás com um liquidificador na mão (risos). Para mim esse é o mais marcante porque Casas Bahia não tem nenhuma ligação com dança, mas lá estou eu representando os B-Boys com uma das marcas mais famosas do Brasil. E já fiz vários importantes, como comercial da TIM, Semp Toshiba, Oi, Venish, Renner, Riachuelo, Zara, entre outros.
BW: Na sua opinião, é possível viver da dança no Brasil?
Pikira: Depende de como o B-Boy ou B-Girl quer viver, se for de competição, no Brasil, eu acho impossível, porque além das premiações serem muito baixas, os breakers não vão ganhar sempre, na minha opinião! Agora, se viver da dança dando aulas de Breaking através de projetos e fazendo espetáculos e trabalhos com marcas, aí sim!
BW: Você já competiu fora do país? Ou teve experiências fora? Nos fale sobre isso…
Pikira: Infelizmente, não sai do país ainda. Quando eu ia sair, veio a pandemia (risos)… mas pretendo sair para competir e ver como é lá fora.

BW: Em toda sua caminhada na dança nos fale sobre momentos que foram importantes e também momentos lamentáveis que se pudesse voltar no tempo tomaria outro caminho.
Pikira: Um momento muito importante na dança pra mim foi quando eu gravei uma série de dança com a banda internacional Black Eyed Peas, que se chama Freestyle Fridays e ainda fui convidado por eles a dançar no show deles no parque do Ibirapuera, em São Paulo, junto dos meus amigos da Tsunami All Stars, que são referência mundial, isso foi bem importante pra mim porque eu sempre fui fã das músicas deles desde criança e poder conhecê-los e trabalhar com eles foi simplesmente incrível, agora sobre lamentações eu sou um cara que não fica se lamentando ou arrependendo de coisas que fiz, sabe? Acho que a vida é feita de momentos bons e momentos ruins, então, cabe a você saber lidar com os momentos e agradecer pelos momentos ruins também, porque tudo na vida é aprendizado.
BW: Como tem sido esse tempo de pandemia? O que tem feito?
Pikira: Esse tempo eu tenho trabalhado normal, mas tive que me adaptar e investir em um bom celular para poder fazer minhas publicidades em casa por celular.
BW: O que acha sobre o fato do Breaking virar uma modalidade olímpica?
Pikira: Acho incrível! Porém, não estou muito por dentro, porque é tudo muito novo, mas tenho grandes expectativas que isso venha a agregar coisas boas para a cena do Breaking no mundo.
BW: Quais são seus planos para o futuro?
É difícil falar, pois sou muito cauteloso com meus planos (risos). Mas posso dizer que vou continuar a dançar até que eu não consiga mais me movimentar (risos), pretendo conquistar muita coisa ainda e ir com calma, sou muito novo ainda, tenho 24 anos, ainda tem muita coisa que quero viver, sabe? Mas sempre pensando no futuro, claro!
Fotos: Arquivo Pessoal / Daniel Favieri / Hugo Victor
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