O incrível B-Boy Luka: Conheça a história desse artista que longe do Brasil se tornou singular em sua dança e na arte de inspirar pessoas
Ele nasceu no bairro do Tatuapé, mas sua infância foi na Vila Curuçá, em São Miguel Paulista. Seu sonho, como a maioria dos meninos brasileiros, era ser jogador de futebol, sempre incentivado pela família. Começou a jogar com apenas 4 anos. Depois, conheceu a capoeira, onde no primeiro dia se identificou, sentindo-se em casa e livre. Durante anos, jogava futebol e fazia capoeira. Mas foi em 2006, com apenas 12 anos, que mergulhou de corpo e alma no Breaking. Sua evolução foi rápida! Foi o futebol e a capoeira que lhe deram a base para tudo, confessa que sem eles não teria a dedicação e foco que tem hoje. Foram nessas artes que aprendeu a ser persistente, paciente e dedicado. Os primeiros passos de Breaking deu na própria sala da casa onde morava, vendo um DVD da Red Bull BC One, onde tentava copiar os movimentos, o pai também tinha coleção de discos em casa, cresceu escutando alguns clássicos do Hip-Hop, a música sempre foi presente em sua vida. O menino ganhou idade, conquistou seu espaço, aprendeu a dançar no meio da pressão e sobreviver às críticas, resolveu viver sua própria vida, da sua forma e aprendeu que o segredo sempre foi focar no presente, no agora, plantar as sementes para colher no futuro com muita paciência e dedicação. Recebeu influência de grandes nomes do Breaking e caminhou alguns anos lado a lado com o inesquecível B-Boy Kokada, esse foi um amigo que se tornou irmão. Sim, estamos falando do B-Boy Lukas Galante, o Portal Breaking World teve o prazer de conseguir conversar com ele, entre um compromisso e outro, nuns horários bem doidos e conhecer boa parte da sua história de vida, que apresentamos com exclusividade para vocês. Confira a entrevista!
BW: Luka, nos fale onde e quando nasceu, nos conte um pouco sobre sua infância, adolescência e família. O que gostava de fazer? E que lembranças memoráveis você tem dessa época? Foi uma infância tranquila e feliz ou houve dificuldades?
Luka: Nasci em São Paulo, no bairro do Tatuapé, no dia 21 de fevereiro de 1994. Cresci na Vila Curuçá, em São Miguel Paulista. Eu sempre tive o apoio dos meus pais, desde pequeno meu sonho era ser jogador de futebol. Foi onde comecei a praticar em uma escolinha do bairro, por volta dos 4 anos de idade. Nessa mesma época, meu pai queria que eu praticasse Ginástica Olímpica, acredito que a ideia dele era proporcionar opções para eu poder praticar e me identificar com alguma arte. Lembro que ele foi atrás, mas não tinha nenhum espaço ou ginásio que ensinasse na região em que morava. Foi aí que surgiu a ideia da Capoeira. Morávamos a um minuto de uma academia e lá eles tinham aulas. Meus pais tiveram interesse e me levaram para fazer uma aula e ver como eu me sentia. Eu me senti livre e me identifiquei demais com a Capoeira, desde a primeira aula. Capoeira duas vezes na semana e futebol todos os sábados. Com o tempo, passei a treinar futebol quase todas as manhãs. Fiquei anos praticando e conciliando as duas atividades. Eu tive uma infância feliz, nunca faltou nada pra mim.
BW: Futebol no Curuçá Society pela manhã e Capoeira à tarde: quando surgiu tudo isso e até onde você foi? Fale da sua relação especificamente com a Capoeira e de todo o benefício que isso trouxe à sua vida e à sua dança?
Luka: Pratiquei as duas atividades por um bom tempo. No futebol eu fiquei firme até uns 14 anos de idade, tentei virar profissional. Eu comecei a praticar Breaking no final de 2006, eu tinha 12 anos de idade. Na época, eu mergulhei no Breaking, minha evolução foi rápida pelo fato de saber alguns movimentos parecidos da Capoeira. Eu me inspirei tanto no Breaking, que a energia que eu sentia na aula ou na roda de Capoeira fazia eu tentar uns movimentos a mais no meu estilo de jogo. Meu corpo se interessava mais pelos floreios, mortais, pulos de mão. Foi quando meu instrutor Marcelo Lampanche conversou com meus pais e depois comigo. Ele sabia que eu estava aprendendo e super inspirado no Breaking, mas estava tirando um pouco o meu foco da Capoeira. Ele conversou e deu a ideia de eu seguir firme somente no Breaking. Sem a formação de vida que eu aprendi não só na Capoeira mas no futebol também, eu não teria a dedicação e foco que eu tenho hoje. Foram nessas artes que eu aprendi a ser persistente, paciente e dedicado. Me ensinou que nada cai do céu, você tem que ir atrás, treinar e se dedicar se quiser atingir um nível bom. Fora os valores que você leva para a vida, como história, música, respeito e valor em fazer aquilo que você ama.
BW: Quando você teve o primeiro contato com a Cultura Hip-Hop? E com o Breaking? Teve algum mentor ou pessoas que te inspiraram na dança?
Luka: Desde criança, meu pai tinha coleção de discos em casa, eu cresci escutando alguns clássicos do Hip-Hop, a música sempre foi presente. Antes do Breaking eu já tirava algumas batalhas de saltos mortais na escola, tinham sempre uns moleques que gostavam de rachar para ver quem fazia melhor. Depois, eu tive influências que me levaram a praticar o Breaking. No final de 2006, eu vi uma reportagem de TV sobre a Red Bull BC One mundial, em São Paulo. Quando eu vi o nome da competição, procurei saber mais. Lembro que achei o DVD da BC ONE 2005 na Galeria do Rock, em São Paulo. Pedi para o meu pai e ele comprou. Assistia o DVD todos os dias e tentava copiar os movimentos na sala de casa. Tinha o DVD acústico do Marcelo D2 também, onde me inspirei muito no Pelézinho e o Chaveirinho. O Pelé foi uma grande referência pra mim, me marcou porque o vi na BC One e na performance para o D2. A partir disso, acabei conhecendo uma galera que praticava no Centro Cultural do Itaim Paulista, bem próximo da minha casa. Foi onde comecei a receber ajuda e conheci algumas lendas da zona leste de São Paulo: Cidinho, Júnior Favela, Careca, Dan… Esses foram os primeiros caras que me ajudaram a desenvolver a minha dança e acabaram sendo grandes mentores e influências para mim.
BW: Onde você deu os primeiros passos e fez os primeiros movimentos de Breaking? Quando você decidiu realmente que era o Breaking que você queria para a sua vida?
Luka: Na sala de casa! Consegui aprender com facilidade, alguns movimentos que já fazia desde criança foram base para aprender depois no Breaking. A minha evolução começou na época do Centro Cultural. Não teve momento de decidir se o Breaking era algo que deveria seguir… tudo aconteceu naturalmente, acredito que foi fruto de toda a dedicação e persistência. Eu fui plantando sementes dia após dia e esse processo sempre foi presente na minha vida, não só no Breaking. Tudo o que eu visualizo e quero, eu aplico as sementes e atitudes necessárias para a colheita no futuro. O segredo é focar no presente, no agora. O futuro ainda não chegou. Você só pode atuar no agora. O futuro é consequência do presente. Quando você ama o que faz, já está decidido e tudo trabalha para você naturalmente.
BW: Normalmente, a maioria dos B-Boys e B-Girls não têm o apoio da família na dança. No seu caso, como isso aconteceu? Seu pai e sua mãe parecem muito presentes e incentivadores da sua dança. Nos conte como foi essa relação Breaking e família?
Luka: Sempre presente. Não só no Breaking, em todas as atividades que participei. Esse apoio é fundamental, imagine quantos talentos e sonhos seriam realizados se as crianças tivessem o apoio de suas famílias. O problema é que os pais fazem pelos filhos aquilo que eles acham que seria o melhor caminho da vida… A profissão ideal, algo que vai te proporcionar conforto e dinheiro. Mas não reparam na energia e amor, naquilo que a criança ou jovem quer seguir como carreira. Eu acredito que muitos jovens são reprimidos nessa questão, de seguir a sua vontade e intuição e acabam desistindo de seus sonhos por não ter aquele apoio e conexão com aqueles que estão do seu lado todos os dias. Por isso a importância de ter a família lado a lado, te apoiando em cada passo. O investimento no apoio, sendo assim os pais se aproximam e passam a entender a vontade do jovem. No meu caso, foi isso que aconteceu. Eu tive fases, Capoeira, Futebol, Basquete… sempre fui apoiado, mas segui a natureza do meu talento na dança. Na escola, sempre fui um bom aluno, mas nada me cativava e eu me questionava… O que vou ser quando crescer? Eu gostava de me movimentar, não importava a atividade. E na dança eu percebi bem novo que era uma arte vista como sem futuro, na opinião de muitas pessoas próximas de mim. Mas, graças ao meu próprio apoio, da minha família e das pessoas que acreditavam em mim, eu segui meu coração e vivo do Breaking.
BW: No aprendizado do Breaking houve movimentos mais difíceis para aprender? Ou tudo foi bem tranquilo para você?
Luka: Eu sempre tive facilidade para aprender qualquer movimento. Acho que isso faz parte do meu estilo diversificado. Principalmente atualmente, eu sinto que tudo é possível. Eu consegui perceber certa facilidade bem cedo no Breaking. Como eu tinha facilidade, eu tive inspiração para aprender tudo. Cada um do meu círculo de treino tinha algo especial e eu fui extraindo as técnicas de cada um. Kokada, Careca… lendas do Power Move, estavam lado a lado comigo. O Cidinho e outros caras nos saltos mortais. Jack, Allan e os outros meninos me ajudaram nos tricks e transições, na minha época da Biohazard Crew. B-Boy Fatal na influência de dinâmica, velocidade, Top Rock, Footwork e espírito de batalha. Eu fui aplicando as minhas idéias e trabalhei todos os fundamentos. Lógico que eu tenho minhas dificuldades, todos nós temos… mas como eu sempre estou ativo e treinando, o processo de aprendizagem acaba sendo mais rápido. Eu tenho muito o que aprender e melhorar e sempre será assim, no Breaking e na vida. Influências diferentes, gostos e ideias… que continue fluindo e criando.
BW: Em que ano você começou a competir e participar de eventos? Imagino que foram muitos eventos até hoje que você participou, mas teve algum que te marcou de uma forma diferente? Nos conte?
Luka: Em 2007 foi o ano do meu primeiro evento. Lembro que foi um evento em Mauá, SP. Depois desse evento, comecei a competir com frequência com a minha Crew, Biohazard, na época. Foi aí que comecei a minha história. A Biohazard foi a primeira Crew criada por mim e os outros meninos da época. Dois eventos marcaram bastante, a BOTY (Battle Of The Year) Brasil, em 2010, onde ganhamos a vaga para a BOTY Internacional, sonho que eu tinha, de viajar com meus parceiros e ver o nível mundial de perto. E o segundo evento, a minha participação na BC One Camp 2007, em Amsterdam. O Camp me marcou muito, faziam 3 anos que não competia, já estava morando aqui nos Estados Unidos. Comprei o vôo para a BC One na Holanda e fui com a ideia de curtir com minha Crew (Tsunami) e competir no 3 versus 3, no Camp. Me marcou porque não sabia o que esperar da minha performance e da energia da batalha depois de alguns anos.
BW: E quando você começou de fato a viver da dança? Como foi isso? E que mudanças foram necessárias ocorrer na sua vida, na sua rotina para que isso fosse possível?
Luka: A minha rotina sempre foi treino, me preparar ao máximo para as oportunidades e também o jeito que eu transmitia a minha energia em cada sessão e trabalho que participava. Acho que essa rotina de treinos intensos e acreditar na minha dança ajudaram na minha formação e oportunidades de trabalho. No Brasil eu já vivia da dança, mas não tinha um retorno necessário para poder caminhar com as minhas próprias pernas. Eu dava aulas, participava de shows, TV e os eventos de Breaking. Mas minha vida mudou quando recebi a proposta do Cirque Du Soleil, em 2014. Foi a base para eu poder viver só da minha dança. A mudança necessária não foi fácil, sair da casa dos meus pais e morar fora do país. Mas foi onde mudou e marcou de fato a minha carreira. Na época eu tinha 20 anos, estava viajando e competindo, mas percebi que não estava gerando nenhum retorno financeiro, mesmo dando workshops, viajando pelo Brasil e fazendo shows… eu não tinha nada fixo e nenhum apoio. Tudo mudou quando vim para os EUA.
BW: Quando você foi a primeira vez para fora do país? O que sentiu? Quais as diferenças que sentiu entre o Breaking que aprendeu aqui e o que era feito lá fora?
Luka: Em 2010, BOTY Internacional. Eu Tinha 16 anos. O sentimento era incrível. Tinha todo o lance da cultura de um país diferente, a curiosidade de um lugar diferente, a comida, o visual. Sempre acompanhava a cena internacional pelos vídeos, foi a minha inspiração diária. Estar presente pela primeira vez e ver B-Boys e B-Girls que assistia através dos videos pessoalmente foi especial. Me mostrou oportunidade futura, porque consegui ver meu próprio potencial se eu trabalhasse e confiasse no meu Breaking. A diferença pra mim foi a dinâmica e criatividade, principalmente nas Cyphers e backstage. Mesmo eu sendo novo na época, lembro que consegui entender uma diferença. A energia que nós Brasileiros transmitimos, tem muita história. Não precisamos de movimentos complicados e dinâmicos, a nossa energia já era dinâmica, sendo assim, movimentos que talvez para a cena internacional seriam básicos e visto várias vezes… Nós do Brasil tínhamos um jeito único de dançar e apresentar esses movimentos, com uma dinâmica diferenciada. Um sentimento diferente e história de vida.
BW: Quando participou a primeira vez da Red Bull BC One? E quais foram suas impressões e sentimentos naquele momento?
Luka: Em 2018, final mundial em Zurich, na Suíça. Significou demais! Um sonho desde quando comecei a minha jornada no Breaking e aos 12 anos de idade. Principalmente pelo fato de ser convidado direto e por tudo o que passei para chegar até lá. Cheguei a me questionar se chegaria a pisar um dia no palco da BC One, pela mudança de vida que tive e por deixar a competição de lado por alguns anos. Mas tudo acontece no tempo certo e talvez do jeito que você nem imaginou. O momento marcante pra mim de toda a história foi comprar a passagem de vôo para o meu pai me encontrar lá na Suíça, logo depois que recebi o convite. Foi a primeira intuição que tive, quando acabei de ler o convite. O sentimento era retribuir e ele poder ver eu subindo no palco do evento que me fez começar a dançar e que ele acompanhava. Eu perdi a batalha, mas ganhei no meu objetivo interno, meu pai assistiu ao vivo. Minha missão foi cumprida naquela noite. Queria poder levar todo mundo que me apoiou, se pudesse, como forma de gratidão. A minha impressão foi diferente daquilo que tinha em mente. No sentimento passa um filme, antes de chamar o seu nome passam várias cenas em 5 segundos na mente, de toda a sua trajetória, mas rapidamente você volta para o foco antes da batalha e se sente presente. É realmente incrível! Uma energia totalmente diferente de qualquer outro evento.
BW: Em que ano você passou a fazer parte da Tsunami All Stars? Como era conviver com a Crew?
Luka: Em 2017, foi quando oficializou. Mesmo convivendo com o Kokada na época, entre 2009 e 2012, eu era bem novo ainda, ele me convidava para treinar de vez em quando com a Tsunami, foi onde comecei a conhecer todos da Crew. Mesmo com o calendário de cada um do grupo e por alguns morarem em outras cidades, quando tinha algum evento ou show eu lembro que eles faziam o máximo para estarem juntos e poder trabalhar ideias e criar. Eu acompanhava de vez em quando o processo. Na época, eu tinha meu grupo Biohazard e quando o Kokada estava junto a BioAllstars. Em 2011, dois dias antes da Tsunami viajar para um campeonato na Polônia (Warsaw Challenge), o Pelé teve um problema de visto e não pôde viajar com o grupo, foi quando eu recebi o convite para cobrir a vaga dele e batalhar internacionalmente pela primeira vez com a Tsunami. Naquela época nada foi oficializado, mesmo eu estando envolvido em alguns projetos e eventos. Em 2017 foi quando oficializamos.
BW: Você teve uma grande amizade com o B-Boy Kokada, comente sobre esse tempo… Que lembranças você tem dele?
Luka: O que marca são os momentos fora do Breaking. Eu digo isso porque o “ego” que criamos na cena, na verdade, não é a sua verdadeira essência como pessoa. O Kokada me fez perceber isso. Ele não era o cara que todos achavam que ele era. A nossa relação era de irmãos, consegui entender quem ele era fora da imagem de ranço e lenda do Power Move que ele tinha. Foi um tempo de grande aprendizado e visão. Ele me mostrou visão para o futuro e que a chave para conquistar qualquer objetivo seria somente através de paciência e dedicação. Época também de aprender a lidar com a pressão, ou você gostava do Kokada ou você o odiava. Eu tive essa influência através dele. Já chegamos a dançar com todo mundo vaiando, a música virou vaia e xingamento. Todo mundo contra. Foi onde comecei a evoluir. Essa era a imagem criada por ele, onde todos nós, eu e os outros meninos do grupo, abraçamos e seguimos juntos. Tudo isso marcou a nossa história e também a nossa amizade. Eu aprendi com ele que independente do que acham, continue sempre fazendo o seu. Continue acreditando e lutando, ninguém faz por você. Ele acreditou em uma nova geração e hoje eu ainda continuo aqui, vivendo a vida da minha maneira, dentro e fora da cena. Foi esse o aprendizado na nossa relação, viva a sua história à sua maneira, seja único.
BW: Quando surgiu o Cirque du Soleil na sua vida? Nos fale sobre a experiência e a vida de quem atua num circo? Alguma vez teve que escolher entre o circo e os eventos de Breaking?
Luka: Em 2014, foi quando assinei o contrato e vim para o Cirque. O mais gratificante é você poder viver e respirar aquilo que ama. No Cirque eu tive essa oportunidade, de poder acordar todos os dias e fazer o que mais amo. Treinar, dançar e inspirar as pessoas. No show, todos nós artistas, através da sua especialidade, inspiramos o público a viver a vida com amor e que tudo vai melhorar. O show é dos Beatles, se chama LOVE. Tem uma história e uma mensagem em cada música e ato. Na verdade, no Cirque você tem muita liberdade, tudo no começo é rotina de treino e ensaios, mas com o tempo tudo se torna natural, o volume de ensaios diminui por você repetir os atos várias vezes. Sendo assim, mais tempo livre para treinar meu Breaking e meu físico. Como profissional, eu acredito que eu tenho que estar pronto, meu corpo é o meu investimento, por isso sempre estou treinando e aprimorando minhas técnicas e espírito. O Cirque me deu essa estrutura, tratamento físico, preparação e performance. A escolha na época foi o Cirque, mas isso não tirou a minha vontade de competir e aparecer nos eventos. O ritmo de batalha você acaba perdendo um pouco e isso é natural. Mas mesmo participando poucas vezes em eventos nos últimos 6 anos, eu me mantenho criativo e em forma. Cada experiência me traz um aprendizado. Eu volto para o meu treino com ideias e absorvo a energia que tenho que trazer de volta para melhorar no próximo evento. Sempre que tiver a oportunidade de aparecer e se eu estiver livre, eu irei e expressarei minha dança.
BW: Vamos falar do ano de 2018 e daquela batalha com o B-Boy Issei na Red Bull BC One. Quanto tempo antes você se preparou para aquele evento? O que de fato aconteceu? Como você se sentiu quando inesperadamente o seu sapato saiu? Aquilo te atrapalhou? Houve muitas cobranças após aquela situação? Na época, você chegou a escrever tipo um desabafo no seu Facebook, dizendo que voltaria! Olhando toda essa situação 3 anos depois, o que você aprendeu com tudo isso? E o que diria às pessoas que foram rápidas nas críticas e nas cobranças?
Luka: O que aconteceu foi o que todos viram. O melhor que pôde acontecer pra mim naquele dia. O meu lance é que eu sinto o que aconteceu no momento, como competidor e ser humano. Mas eu não me importo com o que aconteceu. Sendo assim, não carreguei frustração. Isso é algo profundo e poderoso se você souber aceitar. Não precisa de entendimento. Você absorve e usa aquilo como uma grande experiência e aprendizado para seguir evoluindo na sua dança e sua vida. Quando você se frustra e luta contra algo que já passou e aconteceu, você cria uma negatividade. Por que o resultado desejado não veio, porque você achou que merecia ter ganhado por tudo aquilo que você se dedicou e treinou para chegar ali. Foram 6 meses de preparação. Claro que na hora eu senti o peso, quando aconteceu, eu sabia que no primeiro round eu me sai muito bem e que tinha um arsenal forte para sair bem nos últimos dois. Foi quando o tênis saiu e eu não pude pensar com rapidez e usar aquilo ao meu favor. Eu tinha o terceiro round que poderia decidir a batalha. Mas não foi o que eu pensei no momento presente. Eu me deixei abalar. A única cobrança, se teve, foi comigo mesmo, o barulho externo não é barulho no meu interno. Cobrança externa não importa, você é o seu templo. Disse que voltaria porque a vida continua, outras oportunidades surgem. E eu sabia que continuaria minha jornada que pode me levar de volta se eu tiver que voltar. Eu aprendi a deixar fluir, sem expectativa criada pela mente, focar em mim e na minha positividade, que vai ser expressada através da minha dança, resultado é resultado. Alguns ajustes na minha maneira de treinar e preparar também. No final do dia, a mensagem que fica é que eu fiz o melhor que pude com todo o meu poder do momento. E a história continua… sou grato a tudo e a todos.
BW: Luka, nos conte um pouco sobre suas atuais rotinas de treinos de Breaking. Como divide o seu tempo? O que tem feito nesse período de pandemia? Em que país você está? Como é viver longe da família e do seu país? Como você trabalha o seu emocional?
Luka: Treino 5 vezes na semana e descanso dois. Nesses dois dias de descanso, eu relaxo com alongamento, para recuperar meu corpo e estar bem para a rotina nos próximos 5 dias. Treino fisico na manhã duas vezes na semana, com o meu preparador e Breaking à tarde, todos os dias. Essa é minha rotina diária. Ultimamente, tenho tocado e venho estudando o DeeJay também. Nesse período de pandemia, tenho focado mais em mim e nas coisas que amo fazer. Eu estou em casa, nos Estados Unidos. Bate muita saudade de casa e da minha família no Brasil, mas tento focar minha atenção no que venho vivendo atualmente e isso me ajuda a manter o pé no chão, mas não é fácil ficar longe. É assim que trabalho o emocional, foco no agora. Atenção totalmente no presente, em qualquer atividade ou situação que eu estiver faço o melhor que posso. Esse modo de pensar me traz confiança, se eu estiver completamente presente no agora, tudo o que vier no futuro será próspero. Projetos, planos e objetivos são criados aqui no agora e o que tiver de ser será. Eu sou o criador da minha realidade.
BW: Recentemente, o Breaking entrou para os Jogos Olímpicos. O que acha sobre isso? Como você vê o Brasil e seus B-Boys e B-Girls nessa realidade? Estamos preparados para disputar medalhas olímpicas? Como anda esse assunto no país que você está?
Luka: Grande conquista para a arte do Breaking, grandes oportunidades para aqueles que estiverem preparados. A realidade é que o Brasil tem um potencial enorme, muitos talentos no país. Agora, vai depender de como tudo será planejado e organizado. Talento e vontade eu sei que não vão faltar, eu acredito e visualizo a medalha para o país. Eu vejo o assunto bastante nas redes sociais, aqui nos EUA até pela questão da pandemia eu não escuto falar muito pessoalmente. É hora de começar a se estruturar, passo a passo, construir e se dedicar para colher bons frutos. O tempo passa rápido e eu espero que aqueles que estiverem envolvidos tenham boas intenções e planos para apoiar a cena e os dançarinos.
BW: Luka, quais são seus planos para o futuro? O que significa o Breaking na sua vida? Se pudesse voltar no tempo, mudaria alguma coisa?
Luka: Continuar experienciando o que a vida me oferecer, as oportunidades irão surgir como sempre surgiram, abraçar e viver. Eu vou estar preparado e vou fazer o melhor com o meu espirito e consciência. Ultimamente não venho planejando muito, o que eu faço é manter minha energia e espírito em paz. Isso me traz inspiração e harmonia no meu treino e dia-a-dia.
BW: Que conselhos você daria para a nova geração do Breaking? Como devem se preparar? O que devem buscar? E o que não devem fazer?
Luka: Não preparem somente o corpo e movimento, trabalhem a mente e procurem construir uma base. Hoje as oportunidades estão aí. O Breaking vem fazendo parte de empresas e eventos grandes, procurem se valorizar e entender o business por trás dos eventos e trabalhos. Como se comportar, aprender a falar outras línguas, principalmente o inglês. Se hoje o B-Boy brasileiro tem uma oportunidade, tem que saber conversar e negociar. Muitos da nova geração têm o sonho de viver de eventos e batalha, mas não podem esquecer que temos outros caminhos e oportunidades para viver e se expressar através da dança. Cada dia mais estamos evoluindo, o mundo está em constante crescimento, novos talentos e oportunidades. Precisamos acompanhar esse processo de mudança. Quem acompanhar essa evolução não só do movimento mas da cultura em si, são aqueles que irão colher bons frutos. A nossa ação precisa ser aplicada no nosso momento presente, no agora. Não adianta querer ser um bom B-Boy ou B-Girl, ser campeão, fazer parte de grandes eventos e projetos, se não estiver preparando e vivendo o dia-a-dia. Não vamos esquecer o poder de cura e mudança de vida que a nossa dança pode trazer na vida das pessoas, como inspiração. Quando dançar, mostre o seu espírito em sua maneira única. Não coloque rótulos na sua dança, pois dançar é infinito e cada movimento é uma nota na música. Repare que quando você dança de mente livre, você entra na zona e em uma dimensão diferente. Essa é sua essência e verdade. Busquem isso e sigam a sua jornada, sem olhar pra trás. O que passou, passou. Continuem evoluindo, estudando e vivendo.
BW: Você parece ser um cara que reflete muito sobre as coisas, sobre a vida. Quem é o Luka hoje? O que aprendeu em todos esses anos de dança, qual foi a maior das lições?
Luka: Eu aprendi que tudo passa. Eu não sei quem eu sou. Só sei que sou uma consciência vivendo experiências e aprendendo com elas. O Lucas de hoje não é o Lucas amanhã. Tudo é uma constante evolução, precisamos entender que o mundo pede uma versão diferente de nós em diferentes situações e capítulos da vida. A dança é isso, se adaptar. Quando a música toca, nada mais importa. Somente aquele momento, nada mais existe. Eu acho que venho entendendo isso, focar minha atenção na música que toca no momento e na minha vida. A maior das lições não existe, todos os dias pra mim é a minha maior lição e eu agradeço por todas elas. Eu larguei mão daquilo que eu acho que eu deveria ser ou fazer na cena, pois eu acredito que eu já sou, a dança já me completa. Eu não preciso que algo aconteça ou que eu ganhe algum evento para me sentir completo e feliz. Eu comecei a dançar anos atrás, feliz, sem querer nada em troca. Tudo já está em mim. Eu vou continuar minha jornada, vou continuar participando dos eventos, a minha maior competição é comigo mesmo, todos os outros B-Boys que competem, são parceiros que ajudam na minha evolução. Ganhar ou perder, não existe. Todos nós ganhamos e por isso eu continuo motivado a continuar. A cultura, em primeiro lugar, surgiu através da alegria que conectou e reuniu. Por isso o amor pelas Cyphers, não tem julgamento. Somente alegria e uma grande festa.
Fotos: Arquivo Pessoal