De Belém do Pará para o mundo: a história do B-Boy brasileiro que se tornou um dos grandes nomes do Breaking da atualidade
“… Nada, absolutamente nada vai ser fácil e é por isso que poucos conseguem. Por isso, tenha em mente se é isso que realmente quer pra sua vida e corra atrás.” (B-Boy Leony)
Ele nasceu em Belém, capital do estado do Pará, que é uma cidade portuária e a porta de entrada para a região do Baixo Amazonas do Brasil.
Sempre morou no bairro do 40 Horas. Como todo menino, quando pequeno gostava de jogar bola e brincava na rua até altas horas da noite. Hiperativo, não parava nem um minuto sequer. O que nunca lhe faltou foi energia!
Sendo o mais velho dos filhos de Dona Elizete, foi criado com suas irmãs por sua mãe sozinha, mulher guerreira, como ele mesmo relata com orgulho.
Aos 12 anos de idade, por influência de um primo próximo, conheceu o Hip-Hop, se apaixonando no primeiro momento pelo movimento Head Spin [Giro de Cabeça], começando sua caminhada de sucesso no Breaking, passando a competir em 2012.
Mas foi em 2013 e 2016 que conquistou o título de Melhor B-Boy do país. E, em 2017, foi tricampeão do Red Bull BC One no Brasil. Segundo B-Boy Pelezinho, que foi um dos jurados do evento que deu o segundo título para Leony, ele começou a se destacar por sua autenticidade. Na época, Pelezinho declarou: “sabe muito bem combinar os movimentos. Sua habilidade é impressionante, por isso mereceu mais uma vez o título”.
O tempo passou muito rápido e foi generoso com o B-Boy, que gosta de saborear açaí com mortadela em Belém, o consagrando como um dos maiores nomes da sua geração no Breaking, mas também trouxe responsabilidades por ser um B-Boy mundialmente conhecido.
Agora, em 2020, Leony se considera mais “light”, treinando 3 vezes por semana e recentemente experimentou em sua vida a experiência da paternidade, com o nascimento do seu primeiro filho João Miguel.
Ele reconhece que com essa nova fase alguns planos mudaram, mas colocou um objetivo bem motivador, que é ser campeão mundial nos próximos 2 anos. Pretende também ingressar numa faculdade e abrir um negócio.
Gostou da história e quer saber mais? Então confira o papo que o Portal Breaking World teve com esse B-Boy que é um dos grandes nomes do Breaking da atualidade:
BW: Queria que você falasse onde nasceu e cresceu. E contasse um pouco sobre a sua infância e sobre sua vida em família.
Leony: Nasci em Belém do Pará e fui criado no bairro do 40 Horas, que até hoje resido. Minha infância foi muito feliz, como todo moleque gostava de jogar bola, brincava até altas horas da noite e era muito hiperativo, não parava nem um minuto. Sou o mais velho de duas irmãs e fui criado pela minha mãe Elizete, que é uma guerreira que criou os filhos sozinha.
BW: Quando teve o primeiro contato com a Cultura Hip-Hop? Quando o Breaking passou a fazer sentido na sua vida?
Leony: Meu primeiro contato com o Hip-Hop aconteceu por meio do Breaking, meu primo, que foi criado comigo, certo dia chegou em casa e falou que um amigo dele estava fazendo “Hip-Hop” e ele queria aprender como fazia, eu me apaixonei quando vi esse tal amigo do meu primo fazendo giro de cabeça e a partir daí comecei a entrar no mundo do Hip-Hop. Difícil falar o momento exato que o Breaking passou a fazer sentido para mim, porém, quando eu vi os B-Boys e as B-Girls dançando, eu já me apaixonei de cara. Mas, se puder falar de um momento, seria que ele fez sentido pra mim quando eu comecei a ajudar as pessoas ao meu redor.
BW: Com que idade começou a dançar? Alguém te ensinou? Nessa época existiam pessoas que você se inspirava? Além de dançar o que gostava de fazer?
Leony: Comecei a dançar no final de 2008, com 12 anos e no início eu aprendia com os meninos da nossa turma, que começaram a dançar junto comigo, não existia uma pessoa ali pra ensinar. No ano de 2008, o maior nome que já era o destaque era o Amazon B-Boys e eles me inspiravam muito (todos queriam ser eles). Eu antes de dançar fui carateca, cheguei a ser faixa verde e até participei de alguns campeonatos.
BW: Você começou criança na dança e também entendeu cedo que deveria buscar os próprios movimentos e estilo, que foi algo que sempre chamou a atenção. Como foi isso? Verdade que você incluí elementos da cultura paraense como o Carimbó e o Tecnobrega na sua dança? Ser diferente era um objetivo?
Leony: Sim, eu sempre busquei minha identidade, eu olhava B-Boys como Menno, Lego, Abstract, Luigi e queria ter o meu “style”, assim como eles. E por muito tempo não sabia como fazer. Em 2011, eu fui à França e lá foi um divisor de águas pra isso, eu pude conversar e ver com meus próprios olhos o que deveria fazer, então, voltei e comecei a buscar isso. A primeira coisa que eu fiz foi olhar pra minha cultura regional e usar isso, usando movimentos e ideias do Carimbó, por exemplo. Ser diferente era a minha busca, pois acho que isso é o que faz o Breaking ser o que ele é.
BW: Durante seu aprendizado houve movimentos mais difíceis de aprender? Quais? Como você superou as dificuldades?
Leony: Eu sempre tive dificuldade com Power Moves, até hoje não sei o Giro de Cabeça [Head Spin], que foi o movimento que eu me apaixonei (risos). Então, eu notei que tinha mais facilidade para movimentos que exigiam mais técnica a princípio do que força e assim fui aprendendo esses movimentos, como por exemplo, o Moinho de Vento [Wind Mills].
BW: Você teve apoio da sua família na dança? Como todos viam sua ligação com o Breaking?
Leony: A princípio minha mãe achava que era só um hobby, quando ela percebeu que era algo sério, ela apenas me aconselhava a sempre ter um plano B. O resto gostava também.
BW: Como você administra dança e estudo? Qual o seu grau de instrução? Pretende continuar estudando? Na sua opinião são importantes os estudos para quem dança?
Leony: Eu sempre estou estudando e acho que devemos e podemos conciliar os estudos com dança, eu tenho o ensino médio completo e pretendo fazer uma faculdade de publicidade em breve. Estudar é um complemento obrigatório em tudo.
BW: Quando começou de fato a competir? Quais foram os eventos que fizeram toda a diferença na sua vida?
Leony: Comecei a competir em 2008, mesmo logo depois de iniciar na dança. Eu tive dois eventos que me ensinaram muito, o primeiro foi o Boty Brasil 2011 (Battle of the Year), onde competi com minha Crew pela primeira vez em nível nacional. O segundo, foi a “Red Bull under my wing” organizado pelo Pelezinho e que me mostrou como o mundo do Breaking é maravilhoso.
BW: Em 2013 e 2016, com apenas 21 anos, conquistou o título de melhor do país. Com isso as cobranças e as responsabilidades aumentaram?
Leony: Sem dúvidas, principalmente depois de 2016 as coisas mudaram e com elas as responsabilidades com o nome “Leony”. Quando se é anônimo você pode errar, experimentar novos estilos, perder, mudar, porém, quando as coisas mudam e você tem um certo reconhecimento, isso fica mais difícil, as pessoas já criam uma imagem e uma expectativa em cima de você, você deve se preocupar com o que fala, veste e faz dentro e fora do mundo do Hip-Hop, tem seu lado bom, assim como seu lado ruim.
BW: Quando saiu a primeira vez do país para competir? Para onde foi? Dançar com os melhores B-Boys do mundo foi desafiador? O que sentiu?
Leony: Minha primeira vez foi em 2011, para a Battle of the Year, na França, foi simplesmente maravilhoso, eu lembro até hoje de cada detalhe dessa viagem, foi lá que eu olhei pra mim e falei “é isso que eu quero da vida”. Foi um desafio, eu me sentia como se não soubesse dançar nada.
BW: Que diferenças existem entre o Breaking brasileiro e o que é feito no resto do mundo? Digo principalmente em relação ao preparo e à conduta desses B-Boys e B-Girls?
Leony: Organização sem dúvidas é a palavra que nos difere do resto do mundo. Apenas isso, devemos aprender a ser mais organizados em todos os sentidos aqui no Brasil.
BW: Como você foi recebido em outros países? Pensou alguma vez em ir morar fora do país?
Leony: Sempre fui muito bem recebido em todos os países que estive e muitos eu me surpreendi em saber que tinham admiradores da minha dança lá, eu nunca pensei em morar fora do Brasil, meu lugar é em Belém, tomando açaí com mortadela.
BW: É possível viver da dança no Brasil? Conte sua experiência.
Leony: Sim, é possível. Mas como falei, a falta de organização aqui do Brasil dificulta isso para a maioria. Eu, no início, sofri demais com o lado financeiro (ainda passo aperreios, claro!) mas hoje tenho marcas que me apoiam e tenho também uma cabeça mais madura para tratar dos assuntos e de dinheiro. Eu sempre falo que pra que isso aconteça, para que você chegue a viver de dança, você precisa saber muito bem o que realmente quer da dança, existem diversos meios de viver de dança, saiba escolher um deles e planeje e organize seus passos em busca desse objetivo.
BW: Fale um pouco da sua Crew e do seu relacionamento com todos.
Leony: Minha Crew surge em janeiro de 2006, com o nome de Amazon B-Boys, hoje temos a segunda geração e mudamos o nome para Amazon Crew, pois antes não tínhamos mulher no grupo, mas agora temos e esse título de Crew não era confortável. Hoje sou o líder (só nome mesmo – risos) porque na Crew todos trabalham para o melhor de todos. Temos um convívio muito bom e, claro, sempre temos algumas discussões, que são normais, porém, sou muito grato a cada membro da minha Crew por compartilhar momentos únicos ao lado deles.
BW: Muitos almejam chegar onde você chegou mas desconhecem os sacrifícios. Que conselhos você daria para quem pretende ir longe no Breaking?
Leony: Se você realmente quer isso, entenda que é muito mais sacrifício do que felicidade, nada foi fácil pra mim, nunca! Eu treinava em um local de um Metrô, no concreto, todo dia para ficar bom. Em 2016, eu trabalhei de camelô metade de um ano inteiro para comprar minhas passagens para o Red Bull BC One daquele ano e ir para o Japão. Nada, absolutamente nada vai ser fácil e é por isso que poucos conseguem, por isso tenha mente se é isso que realmente quer pra sua vida e corra atrás, sem ter a menor dúvida de que é isso que você quer ser.
BW: Ganhar e perder faz parte da vida de um B-Boy e de uma B-Girl. Mas como você trabalha isso? Se considera competitivo? As pressões interferem na sua dança? Como trabalha o psicológico?
Leony: Eu sou muito competitivo, eu adoro batalhar, é isso que me mantém focado, claro que eu já perdi muito, porém, eu sempre usei isso para me ajudar a melhorar e evitar as derrotas futuras. Hoje eu me acostumei com a pressão dos eventos, mas no início isso me afetava, sem dúvidas. Não tenho uma fórmula para trabalhar o psicológico, eu acho que isso a gente resolve com experiência mesmo, ou seja, batalhe muito para se acostumar com a pressão.
BW: Como é hoje em dia sua rotina de treinos. Quantas vezes você treina na semana? Como tem sido nessa época de pandemia?
Leony: Hoje eu sou mais “light” (risos), normalmente treino 3 vezes na semana, com cada treino desse específico para algo. Esse ano, claro, eu fui afetado e treinei bem pouco. A partir de julho desse ano foi que eu pude voltar a treinar, mas ainda estou bem longe da minha forma.
BW: O que você acha dos eventos on-line? Na sua opinião é uma tendência? Como você pensa que será a vida dos B-Boys depois da pandemia?
Leony: Eles se tornaram uma alternativa para esses momentos que vivemos, eu não sou fã desse formato, não gosto, acho “morto”, mas entendo que foi uma necessidade eles existirem. Não acho que é uma tendência os eventos, mas acho que podemos tirar coisas boas disso, como por exemplo, a quantidades de aulas e cursos intensivos de danças que foram criados esse ano. Acho que isso sim é algo que possa virar tendência e eu particularmente acho muito bom.
BW: Muito tem se falado do Breaking nas Olimpíadas. O que você pensa sobre isso?
Leony: Nossa melhor notícia nos últimos anos. Eu torço demais para que o Breaking entre para as Olimpíadas, pois sei que isso sem dúvida vai alavancar nossa arte.
BW: Quais são seus planos e desafios para o futuro?
Leony: Bom, agora eu sou pai e isso sem dúvida mudou meus planos, eu quero continuar dançando, claro e competindo, vou fazer uma faculdade e em breve abro um negócio pra mim. Tenho vários desafios, mas coloquei um bem motivador pra mim, que é de ser campeão mundial nos próximos 2 anos.
Fotos: Arquivo Pessoal / D Halsin / Little Shao / Red Bull BC One / 22 Nhati / Quando as Ruas Chamam / Reprodução