O gênio por trás da câmera é B-Boy
Fotografar é eternizar momentos, emoldurar sentimentos engaiolados em pixels e na hora daquele movimento perfeito: Click!
Então, acabou o evento onde você fez aquele movimento incrível que levou o público ao delírio. No dia seguinte, a busca pelas fotos começam e o fotógrafo se torna o cara mais procurado da cena! A fotografia tem esse poder de mexer com as pessoas, eternizar momentos, revelar e emoldurar sentimentos! Muitas vezes tem o peso e é mais desejada do que um troféu! Hoje tão presente nas nossas vidas por meio de celulares e equipamentos digitais, parece algo muitas vezes banalizado, dada a facilidade proporcionada pela tecnologia, mas foi uma das maiores invenções do século XIX. E, na verdade, esse trabalho está longe de ser algo banal.
No caso da dança, fotografar dançarinos não é para qualquer um! Uma imagem borrada é a linha tênue entre uma boa foto e uma foto ruim. O borrão de movimento pode ser o inimigo número um de um fotógrafo de dança. Por isso, quanto mais técnica e conhecimento da dança o fotógrafo tiver, maior a possibilidade de ver nas perspectivas dos dançarinos, se antecipando aos movimentos e o resultado são fotos de tirar o fôlego!
O fotógrafo Laerte de Souza Rodrigues (30) que também é B-Boy, conhecido como “The Sarará”, sabe bem o que é isso! Ele declara: “O fato de eu ser B-Boy me faz entender as movimentações e o processo das sessions dos dançarinos, identificando as horas certas de fazer os cliques”. Ele conta que ver o Breaking através das lentes, fotografando a dança, o ensinou muito mais do que quando estava apenas dançando. Num bate papo bem animado, Sarará contou um pouco de sua caminhada para o Portal Breaking World, confira abaixo:
BW – Como foi sua infância e quando começou seu interesse pela Cultura Hip-Hop?
Sarara – Iniciou por meio do meu tio, mostrando algumas músicas de Rap nacional, no meu bairro tinha grupo de Rap, não me lembro o nome ao certo. Quando fui ao show, iniciou a música do “Gangstar-Skills”, meus dois amigos e DG e Beto estavam fazendo “up rock”, dali em diante, comecei a dançar e curtir mais esta cultura.
BW – Quando iniciou, de fato, na dança? Onde e com quem aprendeu?
Sarará – Iniciei a dançar no CAJUV 2005, meus amigos me levaram para conhecer a oficina de Breaking, onde conheci o Professor Soul, ele passou todas bases, entre amigos a gente trocava informações e aprendia um pouco mais.
BW – Teve apoio de alguém da família? De parentes?
Sarará – Não tive apoio da minha família não, mas eu acreditei, fui até fim, sou muito teimoso (risos).
BW – Nessa época tinham pessoas que eram referência no Breaking para você, que te inspiravam? Pode citar os nomes?
Sarará – Inicio pelos meus amigos e amigas, minha comunidade onde morava, tinha DG, o Beto e outros amigos que não lembro o nome agora. Tinha uma menina chama Elisa, ela dançava muito, fazia moinho de vento… aquilo era mágico na época, tanto que foi o primeiro movimento que aprendi. Depois, teve uma galera de fora, Soul, Gerson, aquelas fitas da BC One e da Batalha Final, tudo isto fez parte das minhas referências.
BW – Chegou a competir em grandes campeonatos de Breaking? Em quais e em que ano?
Sarará – Acredito que os eventos que fui foram grandes para mim, uns dos eventos que tenho como lembrança e admiração é “Rival vs Rival”. Gosto muito da energia, participei da confraternização que Afrobreak fez, enfim, fui em muitos eventos. Mas lembranças marcantes foram estes dois.
BW – Quando começou o interesse pela fotografia? De que forma aprendeu a fotografar?
Sarará – Conheci uma amiga, que hoje é minha irmã, a Amanda Lopes, conhecida como “Dinha”. Quando a conheci, ela tinha câmera fotográfica e incentivei ela a fotografar, pois na época não tinham fotógrafas registrando eventos e reuniões de Hip-Hop. A partir daquele momento, a fotografia começou a chamar mais a minha atenção. Iniciamos um projeto de oficina de Breaking com fotografia juntos, dali fundamos a Produtora “Union Break”.
BW – Quando sentiu que deveria fazer uma escolha entre a fotografia ou a dança? Explique a razão da sua escolha.
Sarará – Nunca gostei de ficar preso em uma coisa só, na vila onde eu morava eu aprendi que eu precisa ser múltiplo, não sei o motivo ao certo. Quando eu estava na dança, percebi que a galera do Breaking só vivia aquela mundo, eu percebi que tinha muitas coisas além disto. Com o tempo, fui deixando o Breaking de lado para estudar, fazer faculdade e aprender outras coisas, mas era muito engraçado, porque o Breaking estava em tudo. Eu decidi ficar com a fotografia devido a ir nos eventos e não tinha um registro fotográfico de qualidade nos eventos, eu aproveitei esta oportunidade, ouvi a minha intuição e fui. E assim seguimos até hoje.
BW – Entender os movimentos que fotografava foi um diferencial na sua carreira?
Sarará – Acredito que sim!
BW – Até hoje, quantos B-Boys e B-Girls, em média, já foram clicados por você?
Sarará – Não tenho noção, só sei que tenho arquivos desde 2012. Tempos atrás fui ver a quantidade de fotos, chegava a 650 mil fotos, deve ter mais se eu atualizar mas eu vou chutar baixo: uns 700 dançarinos e dançarinas.
BW – Você, algum tempo atrás, apresentou a genial Exposição “Breaking e suas Expressões”, fale sobre ela.
Sarará – Esta exposição eu queria fazer há muito tempo, esperei 5 anos para fazê-la. A ideia foi pegar algumas fotografias que fiz em eventos e mostrar para as pessoas as expressões dessas fotografias de dança, o nome em si focava no Breaking, mas tinha danças urbanas, pois a ideia principal era “expressões dos movimentos”, não importava o estilo. Acredito que foi de suma importância realizar este trampo, pois mostrou processo de algumas pessoas que parou de dançar e de pessoas que estavam atuando na cena.
BW – Em 2017, você teve seu trabalho reconhecido quando recebeu o Prêmio de Melhor Fotografia de Breaking Latino Americano. O que representou isso para você?
Sarará – Este momento foi importante para mim. Mas foi um momento de análise, pois sabia que tinham fotógrafos com fotos bem melhores que a minha, mas mesmo assim eu ganhei o prêmio, que foi pela votação popular, afinal, evento em São Paulo, grande público de São Paulo, nítido que os fotógrafos de São Paulo teriam maior visibilidade, afinal, era um Prêmio Latino Americano e muitos fotógrafos envolvidos, enfim! Em um certo momento da minha vida eu pensei “mais que merecido” e, no outro lado, eu pensei “não preciso de prêmio para dizer que sou o melhor ou não, afinal de contas sempre coloquei meu melhor em tudo que fiz”. Se tivesse outro prêmio desse eu não participaria, pois creio que tem muita gente boa que também merece prêmios.
BW – Entre dançarinos da Cultura Hip-Hop, tem crescido o número de pessoas que procuram produzir um material profissional, de qualidade, ou isso ainda é algo bem tímido no meio?
Sarará – Demais os dançarinos e dançarinas de Breaking não se preocupam muito com uma qualidade de foto, mas estou vendo alguns se organizando, tirando o DRT, fazendo ensaios fotográficos, tendo um material de qualidade, pois isto influencia muito em uma apresentação de trabalho.
BW – Os eventos de Breaking brasileiros são bons clientes na hora de pagar? Você já teve problemas na hora de receber?
Sarará – Não são bons para pagar, preferem investir em tudo no evento, menos em uma cobertura de vídeo e fotográfica, isto os eventos de São Paulo. Agora, os eventos do interior de São Paulo, fora de São Paulo, têm todo um carinho, um diálogo e pagam até antes do evento. Já tive diversos problemas com alguns eventos, hoje eu tenho possibilidade de ir ao evento que eu quero.
BW – Na hora de fotografar um B-Boy ou uma B-Girl durante uma “battle”, o que você busca captar? Que sentimentos?
Sarará – Quando a dança está fluindo no beat, rola o momento mágico! Captar este momento é único, como se o dançarino ou dançarina flutuassem, gosto de captar estes momentos.
BW – O que você acha da possibilidade do Breaking virar um esporte olímpico? Esse impacto para você, que é fotógrafo, será algo positivo ou negativo?
Sarará – Como fotógrafo, o impacto é positivo, irá gerar empregos, no meu ponto de vista. Mas creio que não terá a mesma mágica de uma “cypher” na praça e de um evento feito por nós.
BW – Recentemente, você vem realizando trabalhos sociais, inclusive dando aulas no Instituto Cativar, em São Bernardo. Nos conte um pouco mais sobre esse trabalho. E também os frutos desse trabalho?
Sarará – Amo o trabalho social. Desde 2012 trabalho nesta área, eu estudei muito, criando metodologias de aula para que os alunos e alunas pudessem ter experiências que marcassem a vida deles. Este trabalho que realizo no Cativar é muito bacana, atuamos no bairro do Cooperativa, temos diversas oficinas, sou educador de Graffiti e Fotografia, levo para eles uma experiência diferenciada, dando autonomia de pesquisa de criação. Este processo tem dando resultados lindos de confiança, autoestima e, assim, seguimos nesta luta.
BW – Existe a frase que “uma imagem fala mais do que mil palavras”. Isso é verdade? E também se aplica ao Breaking?
Sarará – É verdade! Têm fotos que não precisam nem explicar, né? Quando você bate o olho, você imagina diversas coisas: é o poder da fotografia! E, no Breaking, isso acontece muito!
BW – Fale da importância do registro histórico do Breaking por meio de fotos. No passado, acha que muita coisa se perdeu por falta de registro?
Sarará – Nossa! Faltou registro, viu… Na minha época, de 2005 a 2010, não tenho registros dançando, mas creio que agora não faltará, até os celulares estão captando os momentos. Claro que não como um fotógrafo faria, mas cada vez mais as tecnologias são mais avançadas para as pessoas que não são profissionais.
BW – Agora, nesse momento de pandemia, como tem realizado os trabalhos? Quais são seus planos para o futuro?
Sarará – Nessa pandemia estou dando aulas on-line, estou reorganizando meu livro, quero lançar para fechar esta parte, estou pensando na minha nova exposição, que vai ter outro nome, pois quero abranger a dança como todo. Estou estudando ilustrações, fazendo uma pós em arte-educação. Logo estarei ingressando no mestrado, estou aproveitando para estudar inglês também, enfim, resumindo, estou aproveitando este momento para estudar e organizar algumas ideias.